- Obra Poética de Manuel Gusmão
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- Contra Todas as Evidências – Poemas Reunidos III
Contra Todas as Evidências – Poemas Reunidos III
Manuel Gusmão
O meu começo, de alguma forma, está e não está em Dois Sóis, a Rosa, e nesse livro, parcialmente, em dois conjuntos de poemas mais antigos, «As posições do leitor» (1971), «Um alphabeto de 1972», e numa nota final sobre a composição do livro, onde dois nomes heterogéneos são citados: Carlos de Oliveira e Luiza Neto Jorge. Nesta espécie de de recomeço, impossível, a 1.ª sequência, sem título, de 5 poemas e a última, intitulada «A terceira mão de Carlos de Oliveira» respondem às «posições do leitor», e «quatro andamentos para um alfabeto» respondem ao «alphabeto de 1972». Mas também nesta sequência, sobretudo a partir do terceiro andamento, o leitor interfere, produzindo um manifesto misturar dos estilos.
O tempo actual e algo que só do avesso ou a contrapelo posso re-conhecer. Sou inactual, no sentido, espero, em que me desejo intempestivo. O «tempo actual» é um efeito de pensamento produzido pela expansão de uma prosopopeia do «mercado»; uma mistificação global que se pretende tempo, mundo e pensamento únicos, ao mesmo tempo que reprime a efectiva pluralidade de tempos possíveis e de possíveis de mundo; um processo de integral mercadorização do humano, da terra e da água que são o seu corpo não-orgânico, um processo abençoado por uma arrogante meta-narrativa imperial, nascida sobre o pretendido apocalipse de todas as outras.