Mesmo nas condições impostas pela pandemia, a que se juntou a campanha insidiosa e alarmista das televisões e da generalidade da comunicação social, mesmo num espaço limitadíssimo em relação às edições pretéritas, a Festa do Livro esteve, em termos de vendas e participação do público nas diversas sessões de apresentação, «acima das nossas expectativas», segundo Rui Mota, um dos responsáveis da Página a Página. O certo, é que o Auditório da Festa do Livro esteve sempre repleto de um público ávido e atento, ouvindo e debatendo com os autores. «O dever de todo o homem é defender as asas» – Mário CastrimA primeira sessão decorreu, em forma de homenagem, em torno de três obras de Mário Castrim, pretexto para relembrar aquele que foi pioneiro da crítica de televisão. O professor e crítico literário José António Gomes apresentou de modo fundamentado, não escondendo os afectos que o ligaram ao autor, as obras: Novelas, Nome de Flor e Mais Poemas do Avante!, para além dos artigos de evocação da vida e obra de Mário Castrim, publicados no número 196 da revista Vértice, da autoria do próprio José António Gomes, de Alice Vieira, Correia da Fonseca, Eugénio Alves, João Malheiro e Ribeiro Cardoso. Neste mesmo número da revista Vértice, indispensável aos que se interessam pelas questões sociais e culturais do nosso tempo, salientamos o dossier: Consequências Económicas, Sociais e Políticas da Pandemia, no qual participam Alexandre Abreu, António Avelãs Nunes, Fernando Sequeira, Graciete Cruz, Jorge F. Seabra; Manuel Brotas, Miguel Tiago, Pedro Penilo, Pedro Santos e Sérgio Ribeiro. Na apresentação deste número da Vértice, Vasco Cardoso referiu que a pandemia tem servido ao grande capital para «tentar limitar as lutas dos trabalhadores» e nesta ofensiva «o anticomunismo é um elemento que os poderes instrumentalizam», tentando submeter os trabalhadores. Nesta linha de intervenção cívica, e desmontagem dos embustes que nos açoitam, de salientar os livros Kosovo – A Incoerência de Uma Independência Inédita, de Raul Cunha, e Prosas em Tempo de Peste, de José Goulão, livros a que regressaremos em espaço mais alargado. «Peniche foi escolhido pelo fascismo por ficar longe dos centros revolucionários» – Fernando Miguel BernardesUma Fortaleza da Resistência, livro de Fernando Miguel Bernardes, publicado em 1991, pelas Edições «Avante!», foi recordado por José Pedro Soares, seguido de um depoimento emotivo de Margarida Machado, cujo pai, Manuel Machado, foi um dos muitos presos de Peniche. O livro de Bernardes traça com rigor, a história dos militantes comunistas presos naquele Forte, hoje transformado em Museu da Resistência. «Não há literatura inocente. Não podemos abdicar do nosso direito à revolta e à indignação» – João MeloZeferino Coelho, que apresentou o notável contista angolano, afirmou que nos contos de Melo, «o espírito kaluanda, operando o humor como forma de crítica social, está muito presente na sua obra». Três dos livros apresentados, nesta Festa de leituras obrigatórias, O Que é Preciso é Transformar o Mundo, de António Avelãs Nunes; O Trabalho das Imagens – Estudos Sobre Cinema e Marxismo, de Sérgio Dias Branco e Anti-Dühring, de Friedrich Engels, traduzido, com o rigor habitual, por José Barata Moura, têm a ligá-los a análise do marxismo sobre as sociedades contemporâneas e a sua importância na actual fase do capitalismo, versando abordagens diversas, inovadoras e estimulantes, em vertentes como a economia, a cultura e as questões teóricas. Sobre este texto fundamental de Engels, referiu Pedro Maia, numa apresentação didáctica, tratar-se de «um texto polémico, que teve efeito no seio da social-democracia alemã». Merece referência a apresentação dos livros A Quem Pertence a Linha do Horizonte?, de João Pedro Mésseder e Ana Biscaia; O Companheiro, de Sidónio Muralha, ilustrado por Irene Sá e com leitura interactiva de Vanessa Silva e o romance de Ana Margarida de Carvalho, O Gesto Que Fazemos para Proteger a Cabeça. João Luís Lisboa, que apresentou o livro, referiu que «o sofrimento, a luta, o conflito, a sobrevivência tudo está neste livro». A autora afirmou, que «ao fim de 25 anos de jornalismo e de uma escrita formatada, entendi que na minha escrita de ficção não devia fazer cedências: espero apenas que o leitor acompanhe, com o seu esforço, o esforço que faço ao escrever os meus livros». Ricardo A. Pereira: Em todo o lado eu sou «o comuna», menos na Festa do Avante! |